quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Gaia está mostrando

Desde anteontem, segunda-feira, o tempo virou aqui em BH e nublou. Na terça, ontem portanto, pela manhã, desci ao centro da cidade, de ônibus, e fui entregar um documento em uma repartição da prefeitura. Havia uma luz que, por mais que me esforce, não poderia traduzir aqui em palavras. O céu estava de um cinzento colorido, que é o mesmo que se consegue com a aquarela, ao misturar as cores complementares. Explico, ao se misturar cores complementares, se estão misturando todas as cores. Vou exemplificar: amarelo mais violeta é o mesmo que amarelo mais (azul + magenta= violeta). Sacaram?
Mas enfim, estava um cinza amarelado que dava às coisas, em meu sentir, uma intensificação da realidade; é como se aquela luz me dissesse que havia uma outra realidade por trás daquela que via. Até o cheiro mudava com aquela cor. Me recordo de já ter percebido essa luz em outras oportunidades, mas não muitas.
Mas o que quero mesmo falar neste post é sobre o temporal de hoje à tarde. Disse eu, em um post desses que passaram, que iria trabalhar no céu e que depois explicaria melhor o que isso queria dizer. Pois bem, comecei, nesta semana, a trabalhar em uma escola da prefeitura de BH em virtude do concurso em que fui aprovado. A escola que me coube fica na região da pampulha em um bairro chamado Ouro Preto. Trata-se de um bairro com duas realidades distintas. A parte baixa, mais próxima da lagoa, é de classe média, enquanto que a parte alta (onde fica a escola) é bem mais pobre, quase uma favela. A escola fica no topo do mais alto dos morros, e de lá de cima, pode-se ver toda a cidade de Belo Horizonte e mais as cidades satélites e, até mesmo, cidades mais distantes, pois a vista alcance certamente mais de 100 kilômetros. É uma vista linda!
Hoje, meu terceiro dia lá, estavam as coisas transcorrendo dentro da normalidade de uma escola de ensino fundamental. Entretanto, durante a segunda aula, notei que o céu se estava escurecendo e que iria chover. Soou a campainha do recreio e, após fechar a porta da sala, me dirigi à sala dos professores para lanchar. Me servi do feijão tropeiro de escola, que é típico, derramei um pouco de café no copo, e me sentei para comer. Um minuto depois a chuva caiu.
Caiu não, desabou sobre a escola e sobre a cidade uma chuva de granizo como nunca, jamais, vi em minha vida. Eram pedras do tamanho de ovos de codorna. Eram tão duras que batiam com toda a força sobre o solo e não se estraçalhavam; estiquei o braço pela janela e percebi a força da tempestade: as pedras de granizo me machucavam as mãos. Todos ficaram pasmos com a força da tormenta. As crianças, que estavam no pátio, tiveram que se espremer nos corredores, que sendo muito estreitos, não comportavam todos, pois as salas estavam fechadas. Muitos corriam debaixo daquela loucura tentando encontrar abrigo. Em instantes o pátio estava branco de gelo. A parte baixa da escola começou a inundar, o barulho era ensurdecedor. Os professores não sabiam se admiravam o fenômeno ou se desesperavam por seus carros. Larguei a comida e corri à sala para pegar o celular; queria filmar. Nessa empreitada quase tomei um tombo, as pedras de gelo tornavam o chão escorregadio. Era difícil filmar porque não podíamos abrir portas ou janelas, o impacto das pedras era assustador. A chuva de granizo durou quase vinte minutos. As crianças, que durante a chuva alguns se atiravam sob ela ao atravessar o pátio, com exceção de uma menina que se feriu no rosto, saíram intactas, coisa que não compreendo, dada a fúria da tempestade. Tanto melhor. Já os carros ficaram todos amassados e com vidros trincados ou quebrados. Algumas peças, como retrovisores e as que eram mais frágeis, foram simplesmente arrancadas fora. Os tetos e tampas do motor ficaram repletos de pequenos pontos amassados feitos pelas pedras. Se o seguro não cobrir será um tremendo prejuízo. Minha moto passou por tudo intacta. Nem os mostradores se estragaram. Dei sorte.
No final, formaram-se pequenos montes de gelo que as crianças começaram a usar para atirar uns aos outros. Na parte baixa, formou-se uma pequena lagoa onde alguns já estavam a nadar. Uma loucura!
Ficou decidida a dispensa de alunos e professores. Não havia mais estrutura para aula, tudo estava inundado ou molhado.
Quando voltava para casa pude ver o estrago na cidade. Muitas folhas no chão arrancadas pela força das pedradas. Carros aos montes com amassados, muitos com os para-brisas estourados e muita gente voltando para casa assim. Estranhamente, os semáfaros funcionavam e não havia grandes congestionamentos, pelo menos por onde passei.
Repito, nunca vi uma chuva como essa. Lá em cima, na escola, a ventania era tão forte que os eucaliptos envergavam, não se via da cidade lá em baixo nada, apenas aquela cortina de vapor, água e pedras caindo.
É por coisas assim que me convenço da inutilidade de se pensar que o homem possa vir a destruir o planeta. Ela, a Terra, é por demais superior a nós em exuberância e força. A gente pode se destruir, mas ela fica e, ainda que machucada, em poucos anos se renova. Belo e terrível espetáculo ela nos deu hoje!
Ela, Gaia, o espírito da Terra, está abrindo a performance que fará antes de sua partida.
A hora de nossa responsabilidade chegou.

2 comentários:

  1. Eu vi na tevê, mas não imaginava que ela, a chuva de granizo, tinha encontrado você. Foi feia a coisa não? AS crianças ficaram assustadas ou gostaram da experiência? E seu carro, amassou muito? Vixi!!!

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  2. Bete, com exceção de uma ou outra , as crianças adoraram o fenômeno; não se falou em mais nada hoje. Também pudera, milhares de carros danificados. O meu não sofreu nada, simplesmente porque não tenho carro, hehehe. Tenho motocicleta, e ela, recebeu as pedradas sem sofrer um só arranhão. Grande garota!
    De modo geral, as pessoas compartilharam o sentimento de fascínio e medo. Apesar de ser ameaçadora, a tempestade de granizo, ela também é bela; nos mostra a exuberância da Natureza. Foi uma experiência e tanto.
    Abração!

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