terça-feira, 31 de março de 2009

Há muito...























Em horas inda louras, lindas
Clorindas e Belindas, brandas,
Brincam no tempo das berlindas,
As vindas vendo das varandas.
De onde ouvem vir a rir as vindas
Fitam a fio as frias bandas.

Mas em torno à tarde se entorna
A atordoar o ar que arde
Que a eterna tarde já não torna!
E em tom de atoarda todo o alarde
Do adornado ardor transtorna
No ar de torpor da tarda tarde.

E há nevoentos desencantos
Dos encantos dos pensamentos
Dos santos lentos dos recantos
Dos bentos cantos dos conventos...
Prantos de intentos, lentos, tantos
Que atentatam os atentos ventos.

Fernando Pessoa in "Saudade dada"

Para não ter de parar.


Eu sei que ficar postando poesia dos outros,
inda mais os clássicos, pode se tornar
redundante e chato.
Mas, além do fato de me faltar
o que dizer,
há os que disseram muito
e muito pouco
foram ouvidos.
Estou ajudando a divulgar.

Sonetinho à Bocaje

Se não dizer for parte dela e minha,
a carta de amor jazerá na mesa
e o envelope junto, e a estranheza
do poema que me vem na miudinha.

Ouve, estranha, a tua forma é todinha
linda, mas desconfio de tigresas,
o que me faz lançar-me em asperezas
e esfregar as mãos, Ai! a sinhazinha

é uma delícia, um prato fino, um canto
de amor à forma e só de exemplo os seios
grandes, voluptuosos, um encanto.

Já estou tarado em imaginar os meios
de que me vou valer, qual os rodeios
para seduzir-te e quando e quanto.

A culpa é dos banqueiros de olhos azuis...

Minha mãe tem límpidos-lindos olhos azuis que,
agora, depois da cirurgia de catarata, estão mais
ainda e me disse:
_Filho, num tô nem aí! Não foi para mim
que o mestre falou.

domingo, 29 de março de 2009

Vovó

Vovó Lili me lia Olavo Bilac, comigo ao colo, lá pelos meus três, meus sete anos.
Nunca deixei de gostar-lhe.

A Avó

A avó, que tem oitenta anos,
Está tão fraca e velhinha! . . .
Teve tantos desenganos!
Ficou branquinha, branquinha,
Com os desgostos humanos.

Hoje, na sua cadeira,
Repousa, pálida e fria,
Depois de tanta canseira:
E cochila todo o dia,
E cochila a noite inteira.

Às vezes, porém, o bando
Dos netos invade a sala . . .
Entram rindo e papagueando:
Este briga, aquele fala,
Aquele dança, pulando . . .
A velha acorda sorrindo,
E a alegria a transfigura;
Seu rosto fica mais lindo,
Vendo tanta travessura,
E tanto barulho ouvindo.

Chama os netos adorados,
Beija-os, e, tremulamente,
Passa os dedos engelhados,
Lentamente, lentamente,
Por seus cabelos, doirados.

Fica mais moça, e palpita,
E recupera a memória,
Quando um dos netinhos grita:
"Ó vovó! conte uma história!
Conte uma história bonita!"

Então, com frases pausadas,
Conta historias de quimeras,
Em que há palácios de fadas,
E feiticeiras, e feras,
E princesas encantadas . . .

E os netinhos estremecem,
Os contos acompanhando,
E as travessuras esquecem,
— Até que, a fronte inclinando
Sobre o seu colo, adormecem . . .

Olavo Bilac
Saudades...

Água curadora água vem...



Quando o tudo encontra o nada
















Tenho me sentido como um espartano. Não há quase palavras a serem ditas. O mundo está pesado, pesado. Entendo o mundo, compreendo-o. Sei que não está a acabar. É uma transição difícil mesmo. Há, sim, uma crise. Ela é espiritual. Ela é consequência da forma como nos relacionamos com o planeta, com nós mesmos. Ela, também, vem de muito tempo atrás, muuuuito tempo. Lá na esquecida Atlântida começamos o nosso calvário rumo à remissão dos pecados. Os pecados começaram lá. E vieram se sucedendo. Para mim há poucas datas significativas na história humana.
Antes ainda da Atlântida, na Lemúria, a separação dos sexos.
Depois, entre os Turânios, a destruição da velha Cidade das Portas de Ouro.
Então vieram os ários e o Manu Vaisvavata. Aí já temos a história propriamente aceite e conhecida.
Os atenienses e o gérmen da democracia, o Cristo, o império romano do oriente, Bizâncio, os Cátaros, os primórdios de Portugal, a Revolução Francesa e
Hoje.
Tudo isso está voltando dentro de mim. E fora também, é claro.
Em todas essas épocas estive eu. E agora, só tenho um silêncio, um abismo, é coisa demais.
O buraco negro é onde o tudo é tanto que parece nada.
Não há medo visível.
Vamos medo, apareça!
Vou subjugá-lo com o amor.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Continuidades

Positivamente, como diz a leitora amiga,
eu não estou bem.
Mas ontem, na escola, serviram laranjas.
Adivinhem ?

Uma passou-me pelos cabelos
deixando gomos celulares
de lembranças.

Meu único pecado foi não ter filmado tudo isso.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Educação e futuro

A Prefeitura de Belo Horizonte, governada há anos pelo PT, e agora pelo PSB, numa aliança esdrúxula com o também esdrúxulo Aécio Neves, mostra bem que não são partidos políticos que vão redimir o país. Semana passada, lá na escola, distribuiu um negócio com o pomposo nome de "kit literário" para alunos dos últimos ciclos do ensino fundamental.
No kit distribuído aos alunos do terceiro ciclo, antigas 6ª, 7ª e 8ª séries, havia contos de Machado de Assis, Flaubert e Edgar Allan Poe, entre romances de Lima Barreto e poesias de Mário Quintana.
Resultado: os alunos queriam nos vender aos professores os kits por vinte reais. Outros fumaram as páginas dos livros na esquina próxima à escola e outros simplesmente os foram rasgando ao longo do caminho para casa.
É brincadeira a falta de compromisso do estado com a educação.
Sabe-se lá quem lucrou com a compra destes livros e ainda acham que fazem uma média com a comunidade. São uns burros os filhos-da-puta! Pensam que o povo não entende que é uma jogada de marketing.
Eu bem que gostaria de um kitizinho com umas passagens aéreas para conhecer os museus das Európias...

domingo, 22 de março de 2009

Poema livre

Sob as brancas e distantes nuvens
cor de cinza os longínquos urubus
passeiam.
Por trás ainda o céu azul e, além
dele, o mistério faz sua corte, caindo ante nós
de tal maneira qual
nem o finado Luis XV sabia fazê-lo,
dobrando uma das pernas e trazendo a cabeça
rente ao chão,
sedutor monarca.
O que não o impediu de morrer
desgraçadamente, apodrecendo aos poucos,
dia-a-dia, como diziam as más linguas do
cheiro que até a Du Barry tinha
dificuldade em aguentar.
E agora os brancos urubus passeiam sob
as brancas e amarelas e verdes nuvens
azuis
novamente.

Provérbios















Tenho tentado traduzir alguns dos provérbios gregos de Apostolius, que inseri no blog como uma widget, lá no finzinho, on the bottom of the page.
Mas tá difícil hein! Além do meu parco conhecimento, encontrei mais de uma versão dos textos.
Então, estou dependendo do auxílio da versão latina.
Quem sabe alguém não ajuda.

Em grego:

Τὸ μὲν πῦρ ὁ ἄνεμος, τὸν δὲ ἔρωτα ἢ συνήθεια ἐχχαίες.

Em latim:

Ignem ventus, amorem autem consuetudo incendit.


Compreendi a sintaxe grega, mas não entendi o sentido. Faz algum sentido para alguém?

Tal o vento quente, o hábito incendeia o amor.


Talvez o tal vento quente seja um vento de verão, cíclico, e daí a relação com o hábito, o costume, sei lá. Aí seria de se pensar que o amor também é cíclico.

O que vocês acham?



sábado, 21 de março de 2009

Nausícaa e a Odisséia



O conjunto de poemas épicos produzidos durante o chamado período arcaico da Grécia antiga, que vai de mais ou menos 750 à 550 é conhecido como poemas cíclicos. Data do começo deste período os poemas homéricos, os únicos que nos chegaram na íntegra. Pelo menos é o que se pensa.
A partir da Ilíada e da Odisséia, muitos outros foram criados para complementar os acontecimentos cantados por Homero. A Ilíada narra um período de aproximadamente 40 dias durante a chamada guerra de Tróia. Nela, por exemplo, nada se fala sobre a morte de Aquiles ou sobre o cavalo de madeira e a queda da cidade. A Ilíada, a meu ver, é para Heitor. Sabemos desses acontecimentos por esses outros poemas, como a Pequena Ilíada e a Etiópida, que são atribuídos a Lesques de Mitilene ( a ilha de Lesbos) e Arctino de Mileto, na Ásia menor. Estes textos nos chegaram apenas em fragmentos, como a poesia de Safo. Sabemos de seus conteúdos principalmente pelas citações em Aristóteles e Platão comentando os trágicos atenienses, que se utilizaram dos cíclicos na criação de suas peças. Aristóteles considerava-os inferiores literariamente aos poemas homéricos, mas constituem importante material sobre os dois ciclos em que se dividem as epopéias: o tebano e o troiano.
Todos esses textos são, ainda, envoltos em mistérios e incertezas. Mesmo os homéricos. Fala-se em mais de um Homero, ou que teria ele reunido parte de textos mais antigos, aos quais teriam se acrescidos outros posteriores à morte do poeta. Há muitas diferenças e incongruências, principalmente na Odisséia.
A escritora francesa Sophie Chaveau põe mais lenha na fogueira das dúvidas com suas "Memórias de Helena de Tróia". Sugere ela que a Odisséia seria da autoria de Nausícaa ou Nausica, filha de Alcino, rei dos Féaces, que habitavam uma ilha próxima de Ítaca, terra do herói e seu destino final após a longa jornada de vinte anos.
É a Nausica e ao pai que Ulisses, a partir da rapsódia IX da Odisséia, narra toda a sua jornada, desde a partida de Tróia.
A escritora não oferece nenhuma prova de sua afirmação, apenas sua intuição e autoridade de uma pesquisa consistente a meu ver. É bastante crível que o registro da narração feita pelo Odisseu tenha sua origem na expectadora de corpo presente, a princesa dos Féaces, a bela Nausica, a donzela semelhante às Imortais na estatura e no aspecto, nas palavras do mesmo Homero. O que, apesar de lindas-poéticas palavras, descambam na comédia e no riso se nos lembrarmos da altura do astucioso Ulisses.
No entanto, fica aí mais uma dúvida, outro mistério sobre a mitológica guerra e o também mitológico Homero.
Teria ele usurpado à princesa a fascinante história?
Não duvido. Os gregos, salvo exceções, não gostavam das mulheres [talentosas].
E os cristãos não se dão conta de suas raízes pagãs...
Já a Deusa, hoje, vai arrancando, em silêncio e sangue sua mordaça.

Odysseus and Nausicaä - by Charles Gleyre - from Project Gutenberg eText 13725 -

terça-feira, 17 de março de 2009

A podridão

Assim falou a casa branca. Tirei do blog do Nassif:





























Agora, na versão de o globo:

De O Globo

Ao improvisar seu discurso, Lula troca nome de Obama por ‘Obrama’

Tenho estado muito pouco afim de escrever. Estou vazio, um tanto amargo.
Assim, um tanto destrutivo, vou ajudar a destruir esse mau cheiro um pouquinho também.
Argh!

domingo, 8 de março de 2009

Hipácia















O arcebispo de Olinda e Recife, o tal Dom José Cardoso, que excomungou a criança de nove anos que abortou os gêmeos frutos do estupro do padrasto, não é uma aberração da igreja. Se dermos uma vista d'olhos no passado dessa instituição, o sr. José vai parecer apenas um menino pirracento.

Eu já disse isso aqui inúmeras vezes. Detesto as igrejas e as religiões de matriz no antigo testamento da bíblia. A igreja de Roma, esta então, deve provocar a inveja nas almas dos grandes genocidas da história, como Gengis Kã e Hitler, lá no Hades onde se encontram.

Aproveitando o triste fato e juntando à ele outro triste - este mais que triste, pavoroso - acontecimento, vamos lembrar uma mulher extraordinária e seu trágico trespasse. Não conhecia sua história, mas a Rosa sim.

Hipácia ou Hipátia de Alexandria foi o último grande gênio do paganismo. Os santos da ascendente igreja de Roma se encarregaram de calá-la. Eles não podiam, é claro, permitir tanta luz em um mundo que queriam bem mais escuro.

Hipácia foi uma filósofa e matemática neoplatônica que viveu entre o fim do séc. IV e começo do V d.c.

Intransigente em sua defesa da liberdade de pensar, tornou-se objeto do ódio dos santos da igreja, notadamente o patriarca de Alexandria, um tal de Cirilo, que foi o responsável pelo seu assassinato e por outra grande façanha: a destruição da biblioteca da cidade, a maior e mais famosa da antiguidade. Por causa disto, hoje só dispomos de sete peças das dezenas que escreveu Ésquilo. Pensemos em todos os livros perdidos. Esse monstro ajudou no preparo do mundo para as trevas do reinado da igreja no período medieval. Mais tarde seria santificado.

Hipácia, a quem todos os cientistas da época recorriam quando diante de um problema insolúvel foi, diz-se, a inventora de aparelhos como o astrolábio, o planisfério e o hidrômetro. Ocupando na cultural cidade a cátedra do célebre Plotino, lecionava sobre o mesmo e sobre Platão, sendo admirada pela modéstia e inteligência.

Deixemos falar outro gênio perseguido: madame Blavatsky:

“... Hipatia ensinava as doutrinas do divino Platão e Plotino, dificultando com isso o proselitismo cristão, pois descobria o fundamento dos mistérios religiosos engendrados pelos Padres da Igreja e declarava a origem platônica do idealismo do qual a nova religião se havia apropriado para seduzir um grande número de pessoas. Além disso, Hipatia era discípula de Plutarco, chefe da es­cola ateniense, e conhecia os segredos da teurgia; portanto, seus ensinamentos eram um gravíssimo obstáculo para a crença popular nos milagres, cuja causa a insígne mestra podia explicar satisfatoriamente. Não é de estranhar que sua sabedoria e eloquência conclamassem contra ela a animosidade de Cirilo, bispo de Alexandria, cuja autoridade se apoiava em degradantes superstições, enquanto que a de Hipatia tinha por fundamento a inamovível rocha das leis naturais.”

Assim, em março do ano 415, Hipatia foi assassinada, fato que nos relata o historiador cristão do século V, Sócrates, o escolástico:

“Todos os homens a reverenciavam e admiravam pela singular modéstia de sua mente. Motivo pelo qual havia grande rancor e inveja contra ela, e porque amiúde conversava com Orestes e se contava entre seus familiares, as pessoas a acusaram de ser a causa por que Orestes e o bispo não se tornaram amigos. Para dizê-lo em poucas palavras, alguns atordoados impetuosos e violentos, cujo capitão e guia era Pedro, um simpatizante da igreja, chegaram a essa mulher quando regressava à sua casa de algum lugar, arrancaram-na de sua carruagem; arrastaram -na para a igreja chamada Cesárea; deixaram-na totalmente nua; retalharam-lhe a pele e as carnes com caracóis afiados até que o alento deixasse seu corpo; levaram os pedaços a um lugar chamado Cinaron, e os queimaram até convertê-los em cinzas.”


Agora, alguém me diga: O que fizeram de bom ao mundo judeus, católicos e muçulmanos?

sábado, 7 de março de 2009

Endecassílabo, macumba, jurupari, pois que não importa...é uma outra coisa ainda













O doceamargo Eros fez me uma visita
de surpresa, por esta eu não esperava.
Já acostumado com o vazio estava,
mas, oh... lançou-me um olhar a Afrodita!

E se é amor, diz-se: amigo, é desdita!
Pois de Cupido a felicidade estava
muito distante. Sim, que naquela aljava
setas lancinantes só. E a senhorita,

que de tão confusa não percebe o peito
meu, que mais confuso e trespassado ainda,
das flechas de Amor quase que se finda.

E tudo é sonho, uma artimanha, um defeito
que a Cípria me incutiu, com o veneno feito
da cauda azul de uma lagartixa linda.

Provérbios gregos