terça-feira, 30 de setembro de 2008


...uma mulher
onde estávamos
no meio de pessoas
percebi
que os seus olhos
e os meus se procuraram
o tempo todo
fiquei com medo
do que senti no peito
já faz tempo
compreendi...
do que se trata.
Mas em seguida
entristeci, pois
ela tão logo veio
foi
não entendi...

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Educação e futuro

Ontem à noite assisti na tv (agora vejo tv) uma matéria sobre a educação no Brasil. Entre outras coisas vi uma velha professora amada pelas ex-alunas dizer que, hoje, o professor se preocupa mais em como vai fazer para deslocar de uma escola para outra do que com o que está fazendo ali com os alunos. Verdade. Outro dado interessante (que combina bem com o primeiro) é o salário de um professor na Coréia do Sul: R$ 10.500,00. Eu, como disse no post anterior, tenho que trabalhar 55 horas na semana, em três turnos, para ganhar 3.500. E não é só isso. Na escola da tarde não tenho sala ambiente. Tenho que ficar cada dia em uma sala diferente. Na metade delas, a minha mesa está quebrada. Somente hoje (espero) vou ter um armário meu. Na escola da noite tem sala de artes. Acontece que a professora do turno da manhã, que tem 27.000 anos de magistério, se apropriou dela. Encheu a sala de armários que alega serem dela e que, por causa disso e da grande movimentação dos professores do noturno (estou lá já há quase dois anos), não poderia me ceder espaço para colocar um armário meu. Ela não apenas tem cinco armários (daqueles grandes, de aço e de duas portas), como utiliza todos os espaços que existem embaixo das duas bancadas de alvenaria laterais. Em outras palavras, transformou o que é público em privado. Como é bastante comum no Brasil, por sinal. Além disso, as salas são pequenas, as cadeiras e mesas dos alunos são horrorosas e, em sua maioria, danificadas. As paredes, mesmo não estando pixadas, são feias e tristes em ambas as escolas. Material para eu trabalhar na escola da tarde não tem. O negócio é papel sulfite e uns lápis de cores que é melhor nem falar sobre isso. Na escola da noite, o diretor, às vezes, compra o que eu peço. Mas há outro problema lá: o vice-diretor do turno da manhã também resolveu se apropriar do público. Não deixa ninguém utilizar os computadores. Pelo menos como se precisa. Explico. Tenho um material de história da arte excelente que consiste em dez cd-roms. Precisa de ser instalado no micro para rodar um programinha que passa slides de imagens de arte de todos os tempos, enquanto uma locutora faz comentários, juntamente com quadros de biografias e as respectivas linhas do tempo. É um material muito bom e, lá na escola (por incrível que pareça), já temos um data-show. Acontece que o equipamento, que está lá desde fevereiro, ainda não foi utilizado porque o tal vice-diretor não atualizou os micros o necessário para a tarefa de conectá-los ao aparelho de projeção. Apesar das dezenas de bilhetes que lhe escrevi pedindo para resolver o problema. Não resolveu e não me autoriza a fazê-lo. Desisti.
Nesta mesma escola do noturno, no primeiro semestre, muitas foram as noites em que me deitei pensando em como iria dar cabo de um determinado aluno, se é que se pode chamar aquilo de aluno. Ameaçou todos os professores e eu já estava quase decidido a matá-lo. Em legítima defesa é claro. Para isto estava bolando um plano. Até que a direção-cagão resolveu começar a dar umas suspensões. Aí a coisa melhorou um pouco. Os bandidos amansaram. Pelo menos o suficiente para eu dormir sem ter que pensar em assassinatos.
Lá na outra escola, no segundo dia de aula, precisei pedir a uma aluna para me deixar dar a aula. Foi o suficiente para ela me avisar que se eu pegasse no pé dela, ela iria 'dar um jeito' para eu ser mandado embora da escola. Pode?
Em ambas as escolas, há jovens e adolescentes, que conhecem o melECA o suficiente para fazerem o que bem entendem sem que com isso sofram quaisquer impedimentos. Na sexta passada fomos convidados pela representante da secretaria de educação a resolver os casos de dupla repetência de qualquer jeito. Isto é, os imprestáveis para o estudo (porque eles existem) têm de ser subjugados custe o que custar. Temos que fazer algum tipo de milagre para obrigar quem não gosta de estudar a fazê-lo. Se alguém tiver alguma sugestão que me avise, pode deixar um comentário aqui no blog. E tem que ser uma sugestão que não me obrigue a ficar pensando em assassinatos durantes as noites de insônia.
Aí eu me pergunto: vale a pena ser professor? e eu mesmo respondo: Não!
Aí me pergunto de novo: O que posso fazer se sou pobre, estou com 43 anos, não tenho vocação para o comércio e não consigo passar em concursos do judiciário? e isto ainda bem, detesto juízes e advogados.
Entre outros problemas e quase nenhuma solução, será que há esperança?

domingo, 28 de setembro de 2008

Próximo passos

Estou trabalhando o dobro do que estava acostumado nos últimos dois ou três anos. Agora dou aulas em duas escolas: à tarde, na região da Pampulha, para adolescentes e, à noite, em Contagem, para jovens e adultos. Lá na escola da tarde, me perguntaram se não queria pegar aulas de manhã, três vezes na semana, para um projeto na área cultural. Disse que ia pensar e dava a resposta na segunda. Acho que vou encarar. Vai ser cansativo pacas, mas também vai entrar um dimdim a mais. Estou afim de comprar um carrinho. Não vai dar para passar mais este verão que chega só com a moto. Na sexta passada, na hora de ir para Contagem, lá pelas seis da tarde, caiu uma tremenda duma chuva, o que me obrigou a desistir da empreitada; anel rodoviário, de noite, com chuva, não obrigado. Como não posso ficar perdendo aulas, concluí que preciso de um carro. E estou já quase decidido por um Ford Ka. Já andei sondando e pesquisando: Tem bom preço, é econômico, pequeno, seguro barato, estabilidade e é bonitinho. Vamos ver, vamos ver.
Vou me desgastar um pouco trabalhando três turnos (já passei por isso antes), mas dezembro está logo aí. E quem sabe uma prainha no nordeste em janeiro.
E já que falei em dezembro, deixo um sonetinho:

SONETO 575 REVISITADO

Quem disse que o Natal é só mercado?
Por trás do panetone ou da castanha
está um publicitário, uma campanha,
o lucro, as estatísticas, o Estado.

É certo. Mas o espírito arraigado
mais dura que o presente que se ganha,
mais lembra que um peru, que uma champanha
a alguém com mais futuro que passado.

Pois ela, a criancinha, é quem segura
o tempo, em seu efêmero momento,
salvando algo de júbilo ou ternura.

Esqueça-se o comércio! Ainda tento
rever cada Natal, cada gravura
em meio a tanto adulto rabugento...

Glauco Mattoso

sábado, 27 de setembro de 2008

Homenagem ao Paul

Os atores e atrizes do cinema e os filmes sempre me lembrarão as noites mau dormidas, passadas em frente à TV, lá na já distante adolescência. Foi ali que aprendi um pouco de cinema e conheci desde Heidi Lamar, por quem me apaixonei ainda quando eu tinha 6 ou 7 anos (nunca me esqueço do close up da câmera em seu rosto no "Sansão e Dalila"; o que ela tinha de bela, Victor Mature tinha de cara de bebê chorão), passando pelos Roberts (Redford, o canastrão Taylor e os grandes Mitchum e Ryan), pelos clássicos farwests de John Waine e Gary Cooper, pelos noir de Mr. Bogart, pelas maravilhosas Ritas e Marilyns e tantas outras deusas, até as science fictions de Guerra nas Estrelas, os filmes de arte, as comédias, o gênio de Chaplin. O cinema me maravilhou naqueles distantes tempos. Ainda me fascina, mas nem tanto como na adolescência, quando a fantasia ainda impera sobre a razão.
Fica aqui uma homenagem ao carismático Paul Newman, em uma das cenas que assisti nas insones noites lá pelos idos de 70/80. Antológica.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Me falta assunto,

mas à arte não.

XVIII

Dormes... Mas que sussurro a umedecida
Terra desperta? Que rumor enleva
As estrelas, que no alto a Noite leva
Presas, luzindo, à túnica estendida?

São meus versos! Palpita a minha vida
Neles, falenas que a saudade eleva
De meu seio, e que vão, rompendo a treva,
Encher teus sonhos, pomba adormecida!

Dormes, com os seios nus, no travesseiro
Solto o cabelo negro... e ei-los, correndo,
Doudejantes, sutis, teu corpo inteiro

Beijam-te a boca tépida e macia,
Sobem, descem, teu hálito sorvendo
Por que surge tão cedo a luz do dia?!

Olavo Bilac



e para mim (que parei de fumar há 40 dias) e
para os outros:

O cigarro

Paixão, como o cigarro, logo inflama;
É no calor da chama que eu me amarro;
O primeiro pigarro cria o drama:
Cinzas derrama ao peito meu, de barro.

Se não resta do escarro uma só grama,
Mas resta, à cama, o cheiro, à boca, o sarro,
A dor que agarro, vício de quem ama,
Clama pelo sabor de outro cigarro.

Reacesa a paixão, volta a tonteira.
Primeira ela se faz, não traz indício
Do que causou à mente malefício.

O gosto da tragada derradeira
Alucina meu ser de tal maneira
Que, ao invés de curar, aumenta o vício.

Bernardo Trancoso

domingo, 21 de setembro de 2008

Como uma sombra a passar...

Daqui pra frente darei menor atenção ao blog. Ou melhor, talvez não seja caso de mais ou menos, mas de uma atenção melhor. Espero. É que duas escolas por dia (me perdoem os professores brasileiros) me desgastam muito. Mas vamos ver, vamos ver.
Estou sem assunto, eu sei. É que as mudanças em minha vida são como os movimentos do sol e da lua: a gente não vê.
Por enquanto vou aguardando.

Teresa (Manuel Bandeira)

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E os espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas


quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Vida longa ao Kurumin



















Eu uso o sistema operacional linux já há um ano, mandei o ruindows embora, muito pouca falta faz. Para quem usa Debian, Ubuntu, Kurumin ou derivadas, há um programinha maravilhoso que faz, facilmente (trata-se de uma GUI do ffmpeg), conversões de arquivos em diversos formatos, tais como dvd, avi, mpeg, flv, 3gp, wmv entre outros. Chama-se Multimedia Converter e é muito fácil de instalar e de usar.

Descobri neste blog, onde há os links para o download.
Para quem usa outras distribuições linux que não as que citei, tem jeito de instalar também.

Gaia está mostrando

Desde anteontem, segunda-feira, o tempo virou aqui em BH e nublou. Na terça, ontem portanto, pela manhã, desci ao centro da cidade, de ônibus, e fui entregar um documento em uma repartição da prefeitura. Havia uma luz que, por mais que me esforce, não poderia traduzir aqui em palavras. O céu estava de um cinzento colorido, que é o mesmo que se consegue com a aquarela, ao misturar as cores complementares. Explico, ao se misturar cores complementares, se estão misturando todas as cores. Vou exemplificar: amarelo mais violeta é o mesmo que amarelo mais (azul + magenta= violeta). Sacaram?
Mas enfim, estava um cinza amarelado que dava às coisas, em meu sentir, uma intensificação da realidade; é como se aquela luz me dissesse que havia uma outra realidade por trás daquela que via. Até o cheiro mudava com aquela cor. Me recordo de já ter percebido essa luz em outras oportunidades, mas não muitas.
Mas o que quero mesmo falar neste post é sobre o temporal de hoje à tarde. Disse eu, em um post desses que passaram, que iria trabalhar no céu e que depois explicaria melhor o que isso queria dizer. Pois bem, comecei, nesta semana, a trabalhar em uma escola da prefeitura de BH em virtude do concurso em que fui aprovado. A escola que me coube fica na região da pampulha em um bairro chamado Ouro Preto. Trata-se de um bairro com duas realidades distintas. A parte baixa, mais próxima da lagoa, é de classe média, enquanto que a parte alta (onde fica a escola) é bem mais pobre, quase uma favela. A escola fica no topo do mais alto dos morros, e de lá de cima, pode-se ver toda a cidade de Belo Horizonte e mais as cidades satélites e, até mesmo, cidades mais distantes, pois a vista alcance certamente mais de 100 kilômetros. É uma vista linda!
Hoje, meu terceiro dia lá, estavam as coisas transcorrendo dentro da normalidade de uma escola de ensino fundamental. Entretanto, durante a segunda aula, notei que o céu se estava escurecendo e que iria chover. Soou a campainha do recreio e, após fechar a porta da sala, me dirigi à sala dos professores para lanchar. Me servi do feijão tropeiro de escola, que é típico, derramei um pouco de café no copo, e me sentei para comer. Um minuto depois a chuva caiu.
Caiu não, desabou sobre a escola e sobre a cidade uma chuva de granizo como nunca, jamais, vi em minha vida. Eram pedras do tamanho de ovos de codorna. Eram tão duras que batiam com toda a força sobre o solo e não se estraçalhavam; estiquei o braço pela janela e percebi a força da tempestade: as pedras de granizo me machucavam as mãos. Todos ficaram pasmos com a força da tormenta. As crianças, que estavam no pátio, tiveram que se espremer nos corredores, que sendo muito estreitos, não comportavam todos, pois as salas estavam fechadas. Muitos corriam debaixo daquela loucura tentando encontrar abrigo. Em instantes o pátio estava branco de gelo. A parte baixa da escola começou a inundar, o barulho era ensurdecedor. Os professores não sabiam se admiravam o fenômeno ou se desesperavam por seus carros. Larguei a comida e corri à sala para pegar o celular; queria filmar. Nessa empreitada quase tomei um tombo, as pedras de gelo tornavam o chão escorregadio. Era difícil filmar porque não podíamos abrir portas ou janelas, o impacto das pedras era assustador. A chuva de granizo durou quase vinte minutos. As crianças, que durante a chuva alguns se atiravam sob ela ao atravessar o pátio, com exceção de uma menina que se feriu no rosto, saíram intactas, coisa que não compreendo, dada a fúria da tempestade. Tanto melhor. Já os carros ficaram todos amassados e com vidros trincados ou quebrados. Algumas peças, como retrovisores e as que eram mais frágeis, foram simplesmente arrancadas fora. Os tetos e tampas do motor ficaram repletos de pequenos pontos amassados feitos pelas pedras. Se o seguro não cobrir será um tremendo prejuízo. Minha moto passou por tudo intacta. Nem os mostradores se estragaram. Dei sorte.
No final, formaram-se pequenos montes de gelo que as crianças começaram a usar para atirar uns aos outros. Na parte baixa, formou-se uma pequena lagoa onde alguns já estavam a nadar. Uma loucura!
Ficou decidida a dispensa de alunos e professores. Não havia mais estrutura para aula, tudo estava inundado ou molhado.
Quando voltava para casa pude ver o estrago na cidade. Muitas folhas no chão arrancadas pela força das pedradas. Carros aos montes com amassados, muitos com os para-brisas estourados e muita gente voltando para casa assim. Estranhamente, os semáfaros funcionavam e não havia grandes congestionamentos, pelo menos por onde passei.
Repito, nunca vi uma chuva como essa. Lá em cima, na escola, a ventania era tão forte que os eucaliptos envergavam, não se via da cidade lá em baixo nada, apenas aquela cortina de vapor, água e pedras caindo.
É por coisas assim que me convenço da inutilidade de se pensar que o homem possa vir a destruir o planeta. Ela, a Terra, é por demais superior a nós em exuberância e força. A gente pode se destruir, mas ela fica e, ainda que machucada, em poucos anos se renova. Belo e terrível espetáculo ela nos deu hoje!
Ela, Gaia, o espírito da Terra, está abrindo a performance que fará antes de sua partida.
A hora de nossa responsabilidade chegou.

domingo, 14 de setembro de 2008

Enquanto o mundo explode aqui perto, na Bolívia, é fácil a solução: Cantemos!

Então, pensando na riqueza do classicismo, que tal uma brincadeira?
O desafio é traduzir o soneto, sendo que para isto, carece de compreender a sintaxe e as referências; o que, no fundo, é a mesma coisa.

Quem traduz o soneto de Camões?

Enquanto Febo os montes acendia
do Céu com luminosa claridade,
por evitar do ócio a castidade
na caça o tempo Délia despendia.

Vénus, que então de furto descendia,
por cativar de Anquises a vontade,
vendo Diana em tanta honestidade,
quase zombando dela, lhe dizia:

-Tu vás com tuas redes na espessura
os fugitivos cervos enredando,
mas as minhas enredam o sentido.

—Melhor é (respondia a deusa pura)
nas redes leves cervos ir tomando
que tomar-te a ti nelas teu marido.

O poema é um tanto quanto agressivo. Típica estrutura que envolve a relação Ártemis/Afrodite. Há já a relação santa/puta sociabilizada pela igreja.
A finalização é longa, própria do esquema abba abba cde cde.
Parece briga de crianças. Em meio a essas brigas, muitas tragédias se iniciam.
Anquises é o pai de Enéas,
de quem, a mãe é Afrodite.
Anquises era filho de Capis com Temiste ou com Ierômne.
Temiste era filha de Ilo, que por sua vez, era filho de Tros. Estes personagens são os fundadores de Tróia.
Ierômne era uma naiade, filha do Deus rio Simois, que se une ao Escamandro na planície de Tróia.

Pergunta: Que tem Anquises a ver com Ártemis?

Ps. Não é linda a Ártemis bonequinha? Parece com a Salma Hayec.

Um gosto

Algumas pessoas me acham um pouco louco por causa de coisas como estudar o grego antigo; outros, a maioria, acham-me apenas um tolo. Se me perguntam: _ Para que estudar uma língua morta, ó seu bobo? Respondo: _ Porque eu gosto.
Na verdade, não sei o porque estudo a língua de Homero. Talvez porque goste ou me identifique, de alguma forma, com o helenismo. Não é isso grande novidade; não foi por pouco tempo que se estudou o grego e o latim nas escolas. Hoje vivemos uma época não diria anti-clássica, mas a educação de massa parece que precisou botar de lado certos conteúdos em função de outros; e o classicismo pagão foi um desses outros. O que não passa de política educacional; quando tenho falado sobre episódios do ciclo troiano a meus alunos (por causa de Os Lusíadas) eles quase todos sempre mostram-se interessados. Também é impossível não se interessar pela mitologia helênica. Os gregos eram mestres para inventar e contar histórias. Há uma personagem que me vem à lembrança agora que é a Fama. Diz a lenda que antes mesmo de se iniciar a batalha de Mícale, já a notícia da vitória em Platéia havia alcançado as forças gregas (diz-se que as duas batalhas se deram no mesmo dia, uma de manhã, outra à tarde) que se preparavam para dar combate aos persas na costa jônica, onde pretendiam libertar as colônias gregas dali do jugo de Xerxes. Como não havia possibilidade da notícia atravessar o Egeu em pouco mais de duas horas, diz-se que foi a Fama que a levou. Essa notícia estimulou muito os soldados gregos e foi uma das causas dessa outra vitória, que inaugurou o poderio de Atenas no Egeu e o império que foi curto mas que longas consequências trouxe à civilização ocidental. Acho impressionante tais criações mentais: uma deusa, a Fama.

Estudo o grego porque gosto. No momento tenho tido excelentes horas de prazer com a poesia de Safo. Verter para o português o poema sáfico, conseguindo preservar, ao mesmo tempo, o conteúdo e a estrutura é muito gratificante. Ainda que do grego para o português tenhamos que transformar o ritmo quantitativo em acentual. O que é outra viagem de prazer, hehehe.

Na verdade, entendo muito pouco de literatura. Só agora é que me dou ao trabalho de estudar com alguma profundidade a expressão poética em sua complexidade; conceitos como os de adônio, troqueu, dátilo, cesura e icto, entre muitos outros, só agora descobri a existência e estou a estudar e a gostar muito.

Se não, vejamos como se pode inovar naquilo que já tem mais de 2500 anos.
Há pouco mais de um mês, publiquei aqui no blog, uma tradução que fiz de uns versos sáficos muito conhecidos, que entitulei "Ode a uma donzela". Fiz a tradução com o apoio do dicionário, é claro, e de algumas velhas traduções para o inglês. Há alguns dias encontrei várias traduções desse poema para o português. Vejam vocês a riqueza e a variedade de traduções (há muitas mais) deste poema que, segundo dizem, foi dedicado à Atis:

O original

Fr.2

Φαίνεταί μοι κήνος ἴσος θέοισιν
ἔμμεν ὤνηρ, ὄστις ἐναντίος τοι
ἰζάνει, καὶ πλυσίον ἆδυ φωνεύ-
σας ὑπακούει

καὶ γελαίσας ἰμερόεν, τό μοι μάν
καρδίαν ἐν στήθεσιν ἐπτόασεν·
ὡς γὰρ εὔιδον βροχέως σε, φώνας
οὺδὲν ἔτ' εἴκει·

ἀλλὰ κὰμ μὲν γλῶσσα ἔαγε, λέπτον δ'
αὔτικα χρῷ πῦρ ὐπαδεδρόμακεν,
ὀππάτεσσι δ' οὐδὲν ὄρημ', ἐπιρρόμ-
βεισι δ' ἄκουαι.

ἀ δέ μίδρως κακχέεται, τρόμος δέ
παῖσαν ἄγρει, χλωροτέρα δὲ ποίας
ἔμμι, τεθνάκην δ' ὀλίγω 'πιδεύης
φαίνομαι [ἄλλα].

ἀλλὰ πᾶν τόλματον, [ἐπεὶ καὶ πένητα].


Para o inglês

Blest as the immortal gods is he,
The youth who fondly sits by thee,
And hears and sees thee all the while
Softly speak and sweetly smile.

'Twas this deprived my soul of rest,
And raised such tumults in my breast;
For while I gazed, in transport tost,
My breath was gone, my voice was lost:

My bosom glowed; the subtle flame
Ran quick through all my vital frame;
O'er my dim eyes a darkness hung;
My ears with hollow murmurs rung.

In dewy damps my limbs were chilled;
My blood with gentle horror thrilled;
My feeble pulse forgot to play;
I fainted, sank, and died away.

Ambrose Philips, 1711


Para o português, das quais não encontrei o(s) autor(es) das traduções

"Parece-me igual aos deuses
ser aquele homem que, à sua frente sentado,
de perto, doces palavras, inclinando o rosto,
escuta,

e quando te ris, provocando o desejo; isso, eu juro,
me faz com pavor bater o coração no peito;
eu te vejo um instante apenas e as palavras
todas me abandonam;

a língua se parte; debaixo da minha pele,
no mesmo instante, corre um fogo sutil;
meus olhos me vêem; zumbem
meus ouvidos

um frio suor me recobre, um frêmito me apodera
do corpo todo, mais verde que
as ervas
eu fico
e que já estou morta
parece (...)
Mas (...)".


Ventura, que iguala aos deuses,
Em meu conceito, desfruta
Quem, junto de ti sentada,
As doces falas te escuta,
Goza teu mago sorrir.

Quando imagino em tal gosto
ë minha alma um labirinto;
Expira-me a voz nos lábios;
Nas veias um fogo sinto;
Sinto os ouvidos zunir.

Gelado suor me inunda;
O corpo se me arrepia;
Foge-me as cores do rosto,
Como ao vir da quadra fria
Entra a folha a desmaiar.

Respiro a custo, e já cuido
Que se esvai a doce vida!
Arrisquemo-nos a tudo...
Contra uma angústia insofrida
tudo se deve tentar.





Igual aos deuses me parece
quem a teu lado vai sentar-se,
quem saboreia a tua voz
mais as delícias desse riso.

quem me derrete o coração
e o faz bater sobre os meus lábios.
Assim que vejo esse teu rosto,
quebra-se logo a minha voz,

seca-me a língua entre os dentes,
corre-me um fogo sob a pele,
ficam-me surdos os ouvidos
e os olhos cegos de repente.

Torna-se líquido o meu corpo:
transpiro e tremo ao mesmo tempo.
Vejo-me verde: mais que a erva.
Só por acaso é que não morro.



O ciúme

Parece-me igual aos deuses
o homem que, diante de ti e próximo,
escuta a tua doce voz e o teu
riso amorável. Isso faz-me

tumultuar o coração no peito. Na verdade,
basta-me ver-te para que
a voz me falte, a língua
se me fenda e um repentino

fogo subtil alastre
sob a minha pele, os olhos
se me escureçam, os ouvidos
me zumbam, o suor

me inunde, um arrepio
me percorra toda. Fico
mais verde do que a erva. Sinto
que vou morrer.

Mas tudo é suportável, desde que humilde.


E a minha

Ode a uma donzela

Parece a mim que semelhante aos Deuses
é aquele homem que ante ti se senta
e perto então de ti a tudo atenta
no quanto dizes

e em tua graça. E tal que se desnuda
o coração que me estremece ao peito,
pois o instante em ver de ti tal jeito
quedou-me muda.

Se finda enfim calou-me a língua ao fundo,
já um grácil fogo à pele irrompe e a(s)cende,
e os olhos turvos, sons que não se entende:
tudo confundo!

Ah! o suor escorre e é também fremente
o corpo todo; e a palidez me toma
[e tal à seca relva a morte assoma],
de tão carente.

E [inda pobre], corajosa em tudo.

Ps. A exclamação em "tudo confundo!" resolvi depois.



Como se pode ver, as possibilidades são muitas em se fazer a tradução. Vou traduzi-la outra vez em breve. Há coisas que não gostei, que fugiram um pouco da sentido original. Para isso estou investindo na aquisição de alguns livros. No entanto, há coisas de que gostei, como ter conseguido preservar os adônios típicos da estrofe sáfica. Explicando melhor: O adônio é aquele quebrado que encerra a estrofe e que é formado de um dátilo (uma longa e duas breves) e um troqueu (uma longa e uma breve) ou espondeu (duas longas); cinco sílabas portanto. Na tradução, ainda não sei bem o porque, decidi por uma tônica na quarta sílaba do quebrado adônico, como em 'tudo confundo' e 'de tão carente'. Esta parte eu gostei e deu muito trabalho.

Bem, gosto de estudar o grego pela poesia. Seja lírica, como a sáfica; trágica, como em Ésquilo; a épica de Homero; ou o cômico Aristófanes. Em Pompéia, nos meados do século XVIII, encontrou-se fragmentos de alguns poemas de Safo. Não estou bem certo, mas entre esses estava a "Ode a Afrodite".
Se encontrarem mais poesia em Herculano será muito bem vinda. A beleza não tem idade, é coisa que brilha por dentro.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

O trânsito e os batráquios com complexo de Ayrton Senna

















Aqui em Belo Horizonte o trânsito é muito louco, como todos já sabem, e em parte é por causa dos sobes-e-desces e em parte pela burrice mesmo. Então todo dia, ou melhor, toda a noite é a mesma coisa. A grande artéria que liga a zona leste à oeste, no trecho sinalizado com os semáforos, tem o limite de velocidade de 60 km/hora. Eu estou voltando para casa, já são dez e quarenta, ou por aí, e me interesssa muito não precisar parar em sinais. É que é um tanto quanto perigoso. Há um comércio bastante intenso de peças de motocicletas. Ah, é claro, sou motociclista.
Mas como ia dizendo, não é lá muito saudável ficar parado em sinais em cruzamentos ermos depois das dez horas da noturna. Por isso, não gosto de parar em sinais à essas horas. Por incrível que possa parecer, a programação semafórica dessa grande artéria urbana transportadora de veículos e seres humanos, entre outras coisas, é feita justamente para que se ande dentro do limite de velocidade, que como disse é de 60 km/h. E assim eu faço porque assim não preciso parar em sinais. Há noites em que percorro os 15 km entre a escola e minha casa sem precisar parar em um único dos mais de 20 semáforos que há no caminho. A única coisa que me impede de realizar este extraordinário feito é a burrice. Porque passam por mim, às vezes a mais de 140 km/h, os idiotas alucinados pela velocidade. Mas o que que eu tenho com isso? Tenho que os mesmos idiotas, quando chego com a minha calma dos 60 ao sinal, estão todos lá, parados, esperando, às 11 da noite, numa esquina erma do centro da cidade, sem que isto fosse necessário. E aí, quando não tem aquela brechinha pra eu passar, tenho que parar.

FICO INDIGNADO E MUITO PUTO DA VIDA COM ESSAS BESTAS QUE PASSAM POR TODA A VIDA SEM COMPREENDEREM QUE NÃO PRECISAM PARAR NO SINAL, NEM ARRISCAR A PRÓPRIA VIDA E A DOS OUTROS, NEM ME OBRIGAR A REDUZIR AS MARCHAS, NEM GASTAR A MINHA EMBREAGEM, SE ANDASSEM DENTRO DA PORRA DO LIMITE DE VELOCIDADE DA VIA.
VÃO SE F..., BATRÁQUIOS!

Pronto, desabafei. Me perdoem os leitores que não gostam de palavrões e quepisloques, mas isso aqui é mesmo um bom lugar pra gente desabafar, não é? Então sejam tolerantes comigo, por favor, porque é só o que me resta. Os dromedários da velocidade urbana jamais irão compreender estas singelas explicações.

Ps. Hoje vi dois acidentes com motociclistas. Um deles, se não morreu, ficou muito machucado. Vamos acalmar minha gente, para que tanta velocidade? Eta gente louca!

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

e há dias...

Deixando de lado minhas incertezas existenciais, olhem que notícia mais bacana. Como posso ficar me queixando, quando sonhos da juventude vêm se realizar?

...As políticas sociais compreendidas nessa rede, geridas de forma republicana, articulando as iniciativas do Governo Federal, dos estados, dos municípios e do Distrito Federal, favorecem não apenas aos seus beneficiários diretos, mas a toda a sociedade. Tanto do ponto de vista da justiça e da coesão social, como também da economia.
Famílias que antes tinham dificuldades para atender às suas mais básicas necessidades de subsistência passam também a poder adquirir bens de consumo duráveis que representam melhorias significativas em suas condições de vida e que podem ainda oferecer oportunidades para geração de renda. Isso cria um ciclo virtuoso: o aumento da renda disponível impulsiona o consumo que, por sua vez, incentiva investimentos e o aumento da produção e do emprego. ...

...

Segundo a FGV, a classe média, pela primeira vez, representa mais da metade da população brasileira (51,9%). A dinâmica do mercado de trabalho tem desempenhado um papel crucial para o crescimento da classe média. Os dados apontam um aumento da probabilidade de mobilidade social ascendente a partir de 2005, o que permite às famílias aspirarem a melhores condições de vida no futuro e não temerem tanto uma regressão a faixas mais baixas de renda. ... continua

Ainda que muita desigualdade, o país se vai tornando mais justo. A miséria, lenta mas seguramente, vai desaparecendo. Em minha juventude não acreditava que isso fosse possível. Muito sofri por não visualizar luz no fim do túnel. Muito mal me fiz por ter crido que não havia futuro que valesse.

Hoje leio notícias como essa que me fazem feliz.
Torno-me professor municipal de uma das principais cidades do país, e se nada se alterar vou trabalhar nas nuvens (depois falo sobre isso).
Planejo com meu filho uma viagem à Europa para quando ele formar no ensino médio daqui a quatro anos.
Há muita coisa boa. Mas é preciso prudência. Não se deve levar as coisas da vida tão a sério. Tristezas há, como alegrias também. O bom é estar calmo e atento a tudo isso.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Há dias...

Esta noite tive um sonho. Na verdade foi um pesadelo. Mas o pior não foi isso. Acordei com a sensação de que o mundo era um pesadelo maior ainda. Há dias que o melhor é morrer. Ou sei lá, sumir. Ó dia miserável este. Por que tenho que saber que tudo é responsabilidade minha? Tudo, tudo, tudo. Meu mundo simbólico, meus valores, o que me dá sentido de viver, cada dia vai se desfazendo mais. O mundo material também. Cada vez mais rugas no rosto. Cada vez mais dores no corpo. Cada vez mais a certeza de se estar ficando só. Cada vez mais o itinerário espinhento...e longo. Por que fui vir para cá? Penso sempre em um acidente com a moto, uma topada a 80 km/hora, mortal e imediata. A vida se resume a trabalhar, comer, fazer exercícios para o corpo, dormir, resolver problemas (freqüentemente dos outros que o trabalho mo obriga), ler um livro e nada mais. Nem tenho muito a dizer sobre isso. Pois é somente isso, cansaço, tristeza. Nem o céu azul, nem o verde da copa das árvores, nem os pássaros a cantar, nem o sol a brilhar, nem as estrelas na noite do firmamento, nem a lua, nem Deus, nem si mesmo, nem nada. Há dias que o melhor é morrer, ou sumir.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

O desespero

Eles, os vampiros, isto é, veja, aqueles que sugam a energia dos outros. Aqueles que ganham com o estado em que as coisas são decididas por poucos para a responsabilidade de muitos. Aqueles ou esses estão desesperados. Um desses é o mago negro gilmar mendes (ou mentes). Está ameaçando o presidente da república como se pode ver:


"O presidente do Supremo considerou “um crime extremamente grave” a interceptação telefônica clandestina e disse que é o caso de cobrar explicações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Nesse caso, o próprio presidente da República é chamado às falas, ele precisa tomar providências.” continua


O presidente Lula, como muitos sabem, representa a virada de 500 anos sobre os destinos do país. Aqueles que sempre detiveram os privilégios (representados ainda no poder como é o caso do mendes) estão cada dia mais desesperados e arriscando jogadas que muito provavelmente vão levá-los à guilhotina. Bem, é modo de falar, não agimos mais assim, né. Mas este senhor está sofrendo um caso de delírio e não está percebendo que não adianta mais esse jogo. A tal história do grampo é um engodo, uma falácia, um teatro, uma farsa, uma mentira, nada disso existe. Dai uma olhada aqui e aqui. Está fadado ao fracasso. É claro, vai levantar alguma poeira, principalmente porque aqueles que não deviam dar-lhes ouvidos (como eu) não aguentam e acabam dando pitaco sobre a merda. E a merda acaba fedendo mais. Mas eu me desculpo, é só uma mexidinha, de vez em quando. É muito interessante assistir a esse jogo. Antes ficava com raiva (mentira, ainda fico), mas agora acho é graça. Vamos ver onde vai parar. Não estranharia se o Mentes se ferrasse, contra todas as suas expectativas.

imagens da agricultura
















Rubens, O Rapto de Prosérpina
Museu do Prado, Madri
180 x 270 cm

Prosérpina é o nome romano de Perséfone. A intenção da postagem é imagética, mas decidi colar o texto da wikipedia. Há sempre gente que desconhece a história. Chamo a atenção para o tratamento que Rubens consegue dar às carnes de seus personagens. Seus volumes são mais reais nas carnes do que nos demais objetos ou panejamentos. Acho que Rubens era um sensual. E um grande mestre do Barroco e da Arte.

"Proserpina (correspondente na Grécia a Perséfone) era filha de Júpiter com Ceres, uma das mais belas deusas de Roma. Enquanto colhia flores, foi raptada por Plutão, que fê-la sua esposa. Sua mãe, desesperada com o desaparecimento da filha, caiu numa fúria terrível, destruindo as colheitas e as terras. Somente a pedido de Júpiter, acedeu a devolver a vida às plantas, exigindo, no entanto, que Plutão lhe devolvesse a filha. Como, por um ardil deste último, Proserpina havia comido um bago de romã, não poderia abandonar o submundo de forma definitva. Acabou por se encontrar uma solução do agrado de todos: Proserpina passaria metade do ano debaixo da terra, no submundo, na companhia do marido - corresponde essa época, ao Inverno, quando Ceres, desolada, descuida a Natureza, deixando morrer as plantas - e a outra metade do ano à superfície, na companhia da mãe - corresponde ao Verão, quando a Natureza renasce, fruto da alegria de Ceres. Àquela deusa os romanos dedicavam um festival realizado no dia 31 de maio."

Provérbios gregos