segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

PBH ou como eximir-se de suas obrigações

Este texto caiu no último concurso para professores da rede de ensino de Belo Horizonte. O autor, Gustavo Ioschpe é colunista da Veja e "especialista" em Educação. Filho de banqueiro, o rapaz só estudou em colégios particulares e no exterior. Mas vejam como ele entende de educação popular. Para Ioschpe, só os professores são agentes da educação. Não existe a centralização estatal que formula as políticas públicas. É assim que a prefeitura de BH se apropria da educação. Toda a carga e responsabilidades para os infantes, nós. O prefeito e seus asseclas são mero detalhe. A questão da educação é uma questão de mercado, o qual irá, mais cedo ou mais tarde, resolvê-la. Em outras palavras, é professor quem quer. Quem estiver achando ruim que procure outra coisa para fazer. É simples.

Gustavo Ioschpe
[1] Seu filho vai ser operado do rim em um hospital público e, em vez disso, lhe operam o
fígado. Erro médico grosseiro. “Não venha colocar a culpa em mim!”, diz o médico. “Ganho
um salário miserável, faço plantão em dois hospitais. Estou fazendo um curso de
especialização porque amo essa profissão. É fácil reclamar, mas você não sabe como é
trabalhar em um hospital superlotado, onde faltam leitos e remédios, em que o diretor não
está nem aí. Sem falar nos governantes... E também o seu filho estava tão mal nutrido e mal
cuidado que o rim dele estava com a maior cara de fígado. Com uma conjuntura dessas,
como você pode reclamar do resultado da operação?! Exijo respeito!”
[2] Se eu encontrasse um médico desses na minha frente, provavelmente lhe arrancaria o
fígado e os rins. Não estou muito interessado nas agruras e esforços daqueles que tratam
da minha saúde e dos meus familiares. Quero apenas resultados.
[3] O caso acima não aconteceu. É apenas um símile da educação brasileira, que não é
apenas ruim ou digna de país subdesenvolvido: é uma das piores do mundo. E seus artífices
são principalmente os professores, assim como na saúde são os médicos. Mas, no campo
da educação, as críticas são rebatidas com um movimento-reflexo de culpabilização de
terceiros.
[4] A aula não dá certo porque o aluno é indisciplinado e preguiçoso, os pais são pobres e
burros. Não ocorre que o aluno possa ser dispersivo e desinteressado porque não é
comprometido, porque se interessa por muitas coisas menos por levar a sério o seu
processo de aprendizagem, porque ele recebe um ensino ruim, porque o professor usa
dinâmicas pedagógicas enfadonhas e atrasadas e frequentemente tem baixo domínio do
conteúdo. Quando essas possibilidades são aventadas – e, em realidade, são mais do que
possibilidades: são verificadas em vários estudos, pesquisas e censos - o professor culpa a
tudo e a todos pelo fracasso escolar, e ainda indigna-se que alguém que não dá aula tenha
a pachorra de colocar o dedo na ferida.
[5] O professor de colégio público, por exemplo, é um servidor público e deve sim
satisfações a quem paga o seu salário por meio de impostos e delega ao magistério uma
tarefa cujo resultado também tem fortes conotações públicas, que é a formação das
gerações futuras. A sociedade brasileira começa a acordar para o desastre que é a nossa
educação e o comprometimento dos nossos estudantes. Começa a entender que melhorá-la
significa requalificar os professores, exigir resultados, interferir nos currículos de cursos de
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Pedagogia e Licenciaturas, que os materiais didáticos sejam usados, exigir diretores
competentes, demandar que a carga horária e a disciplina sejam cumpridas, que
professores não faltem e não se atrasem e sejam rigorosos com os alunos que tratam as
aulas com descaso e desdém.
[6] O professorado, demais profissionais da Educação e estudantes podem e devem ser
grandes aliados nessa batalha, mas só serão parceiros quando notarem que a Educação
brasileira não vai bem e que, em muitos casos, eles não desempenham bem os seus papéis.
Nesse momento, tenho certeza de que todos os brasileiros de bem darão as mãos aos
professores e construirão um sistema de ensino melhor, junto. Enquanto persistirem,
professores e alunos no seu auto-engano, na sua impermeabilização frente à realidade, a
sociedade os perceberá cada vez mais como o médico do exemplo acima, e todos nós
continuaremos pagando o pato.
(Texto adaptado – revistaeducacao.uol.com.br/textos/2007)

Aqui , aqui e aqui para saber um pouco mais sobre quem é G. Ioschpe.

Eu, quando anulei meu voto na última eleição para BH, não me enganava. Márcio Lacerda, Aécio Neves, sucateamento da educação (se é que isso ainda é possível) e dos serviços essenciais, Veja, Folha de São Paulo. Dessa turma não sai coisa boa, podem crer.

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