segunda-feira, 14 de abril de 2008

A guerra do fogo - beleza, fanatismo e ignorância






















Como mencionei em um post passado, passei para meus alunos o filme "A guerra do fogo". Quase todos gostaram muito do filme e vários me pediram uma cópia. O filme é de uma poesia sensível e silenciosa. Não há diálogos traduzíveis, isto é, não importa o que os personagens falam pois se trata de uma linguagem rudimentar e desnecessária à compreensão da história. O trabalho de expressão corporal é maravilhoso. A cena em que o protagonista presencia a fabricação do fogo pela primeira vez é linda. Uma música (a trilha sonora, instrumental, auxilia no entendimento das cenas) dramática em crescendo, o homem estupefato, o fogo se acendendo, sua expressão de mistura de espanto, assombro, alegria e compreensão. Tal cena mereceu de uma aluna, senhora já, faxineira da escola, recém alfabetizada a seguinte fala: _Professor, fiquei tão emocionada com aquilo!...São estas coisas que ainda me mantêm na escola, que dão sentido a toda aquela droga: Escutar de alguém uma palavra sensível, um registro de fruição verdadeira, um gesto humano.
Os que não gostaram foram os previsíveis de sempre: os néscios e os fanáticos religiosos. A fanáticos me refiro aos que acreditam (ou querem acreditar) na versão bíblica sem uma pitada de crítica sequer. A minha Bíblia é a "Tradução do novo mundo das escrituras sagradas" (Watch tower bible and tract society of Pennsylvania, 1984), cuja edição em português é de 1992. O texto foi traduzido diretamente do hebraico e do grego para o inglês ao longo dos anos 50 e 60. Inicialmente lançada em seis volumes, a obra, posteriormente, recebeu revisões e notas. Bem, não sei nada de hebraico e por isso não posso falar sobre a parte do velho testamente desta edição. Mas os textos gregos dos apóstolos são muito fiéis ao códice do século IV D.C. que se encontra no Vaticano e é o mais antigo manuscrito completo dos quatro evangelhos que se conhece. Esta Bíblia, segundo me falou um colega de aulas de grego, é aquela utilizada pelas Testemunhas de Jeová. Não sei nada disto também, não sou católico nem protestante. No entanto, alguns professores da escola, evangélicos, tentaram desclassificar esta Bíblia. Ficaram sem argumento quando lhes disse que estava fazendo a tradução do evangelho de João e pude perceber que ela era praticamente literal. São interessantes todas essas diferenças e dissensões dentro da Igreja. Por mim, quero que se danem todas. Não gosto de Igreja alguma.
Mas voltando ao assunto inicial, lá no Gênesis da minha Bíblia recusada, no capítulo dois, versículos 6 e 7 lê-se assim:
" 6 Mas uma neblina subia da terra e regava toda a superfície do solo.
7 E Jeová Deus passou a formar o homem do pó do solo e a soprar nas suas narinas o fôlego da vida, e o homem veio a ser uma alma vivente."
Não é preciso ser nenhum grande estudioso da História ou da Ciência para se fazer uma relação entre este verso e as teorias científicas. Ora, o homem surgiu do pó, ou da lama como se pode verificar pela mistura de terra e umidade. A ciência nos fala da sopa primordial, dos unicelulares, da evolução.
Como sou professor, preciso me limitar em minhas afirmações à versão da ciência. Isto não me impede de emitir opiniões pessoais, desde que deixe claro aos alunos que se trata de uma opinião pessoal, uma crença. Se foi Deus ou a evolução que fez o homem, confesso que não sei dizer e que não me interessa esta dicotomia porque tudo se trata de uma coisa só. Deus é os homens e estes são a ciência. A genética e a reencarnação são uma coisa só e, muito provavalmente, há um plano por trás de toda evolução. Isto em minha modestíssima opinião. Mas os fanáticos têm medo de Deus. Que se danem também os fanáticos!
Já os néscios, estes são para mim um mistério. Jamais encontrei uma forma de falar-lhes. São pior que pedras pois estas ainda são sensíveis à temperatura e pressão. Mas já dizia Sócrates que o pior da ignorância era ignorar-se a si mesma.
Deus os ajude.

Ps. Depois vou fazer um post sobre o filme e sua relação com a ascensão do patriarcalismo.

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